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Depois de quinze anos de discussões, a tão debatida "reforma do Judiciário" pode, finalmente, começar. A nova aposta se concentra em dois mecanismos que o Supremo Tribunal Federal, esta semana, combinou em um só julgamento. Um deles é inédito: aplicou-se o princípio da Repercussão Geral, que vem a ser o requisito básico para um recurso ser apreciado pelo STF. As matérias que não atenderem o requisito da relevância social, econômica, política ou jurídica não serão mais recebidas pela Casa.
A outra ferramenta é o efeito vinculante. Onde couber, as decisões que os ministros entenderem cabais deverão ser obedecidas, inflexivelmente, por todos juízes e pela administração pública direta e indireta — seja federal, estadual ou municipal.
O uso combinado dos dois instrumentos, na estimativa do presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, fará com que os mais de 100 mil recursos que a Corte julga anualmente caia para cerca de 1 mil casos. Ou seja, o STF assume a vocação de julgar princípios e não causas. Em vez de votar processo por processo, os ministros decidirão temas que passarão a nortear todo o sistema judicial do país e o poder executivo. "Vamos tapar as brechas que permitem o recurso como artifício de adiamento", aposta Gilmar Mendes.
No caso piloto, uma questão que envolve a administração pública, a decisão do STF deve-se refletir em 580 processos semelhantes, que tramitam na própria Corte, e em mais de 2.400 casos que estão no Tribunal Superior do Trabalho. Um múltiplo desconhecido desse número envolverá os processos espalhados por todo país.
A decisão do STF de quarta-feira (30/4), tratou da possibilidade de pagamento de soldo com valor inferior a um salário mínimo para quem presta serviço militar obrigatório e a legalidade de se usar o salário mínimo como base do cálculo do adicional de insalubridade. Para o Plenário do Supremo, salário mínimo não pode servir como base de cálculo de gratificações ou adicionais.
A questão sobre a vinculação de adicional de insalubridade ao salário mínimo chegou ao STF por meio de recurso de um grupo de policiais militares paulistas. Com a decisão, o TJ paulista poderá aplicar desde já o entendimento do STF nos Recursos Extraordinários que tratam da mesma matéria.
De acordo com o desembargador Nelson Calandra, presidente da Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis), milhares de ações agora terão desfecho no TJ paulista. “É o pequeno passo de uma longa caminhada”, afirma. Segundo o presidente da Apamagis, o fato de o Supremo ainda ter editado uma Súmula Vinculante sobre o assunto mostra a vontade do tribunal em racionalizar o funcionamento da Justiça.
“A Súmula trará efeito inclusive sobre as decisões da Administração Pública, que terá de obedecer a determinação da mais alta Corte de Justiça do país. Isso irá diminuir o número de ações judiciais porque não teremos mais atos considerados ilegais ou inconstitucionais. É um verdadeiro terremoto jurídico”, diz.
O ministro Marco Aurélio definiu a sessão do Pleno do STF de quarta-feira como “aplicação da verdadeira segurança jurídica”. “O que vimos foi a palavra final do Supremo com efeito vinculante para todos os poderes. É a tábua da salvação. A esperança de que chegaremos a dias melhores. A sessão de quarta é a prova de que o tribunal vive sua melhor fase”, acredita o ministro, que já foi presidente do STF e do Tribunal Superior Eleitoral.
O ministro diz que, nesta sexta-feira (2/5), já solicitará a baixa dos processos que tratam dos temas discutidos pelo Plenário e promete liquidar todos eles “em duas ou três linhas”. “O Supremo vai viver uma época áurea de reafirmação junto a sociedade brasileira, como órgão incumbido de dar a última palavra sobre o Direito posto”, observa.
O advogado Alberto Zacharias Toron, conselheiro federal da OAB, considera que a Repercussão Geral e a Súmula Vinculante são “instrumentos mais que necessários” para a efetiva prestação jurisdicional. “O STF não pode julgar causas que interessem apenas uma ou duas partes, mas sim ações que tenham reflexo na sociedade como um todo”, afirma.
Filtro recursal
A aplicação da Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal, quase um ano depois de sua regulamentação, indica que era infundado o receio de que o instituto cercearia o acesso à Justiça. É o que se conclui da análise dos 38 primeiros casos em que a Repercussão foi analisada. Levantamento divulgado pelo Consultor Jurídico mostra que em 74% dos casos (29 recursos), os ministros entenderam que o tema merece atenção do tribunal — ou seja, o interesse da matéria transcende o interesse das partes. Somente 26% dos recursos (nove casos) receberam a negativa dos ministros.
Das matérias que mais receberam o carimbo da Repercussão Geral, destacam-se as de Direito Tributário. Elas somam 12 casos. Depois vêm as de Direito Administrativo, com nove processos. Direito Civil e Constitucional aparecem em terceiro e quarto lugares no ranking, respectivamente. Os ministros se debruçaram sobre apenas uma matéria de Direito Trabalhista e avaliaram que nela havia Repercussão Geral.
Para o presidente da OAB do Rio de Janeiro, Wadih Damous, a Repercussão Geral racionaliza o trabalho do tribunal, mas não pode ser usada apenas com este intuito. “Meu temor é que o STF despreze assuntos apenas com o fundamento de fazer com que os processos tramitem com mais celeridade”, observa. De acordo com o presidente, o ideal seria que o Supremo Tribunal Federal se transformasse em Corte Constitucional. “Essa é uma reivindicação antiga da magistratura e advocacia e acredito que seja a melhor solução para racionalizar o processo”, diz Damous. “Enquanto isso não acontece, o STF tenta se firmar como Corte e não como terceira instância, usando para isso os mecanismos previstos em lei”, finaliza. (Por Pryscila Costa).
A outra ferramenta é o efeito vinculante. Onde couber, as decisões que os ministros entenderem cabais deverão ser obedecidas, inflexivelmente, por todos juízes e pela administração pública direta e indireta — seja federal, estadual ou municipal.
O uso combinado dos dois instrumentos, na estimativa do presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, fará com que os mais de 100 mil recursos que a Corte julga anualmente caia para cerca de 1 mil casos. Ou seja, o STF assume a vocação de julgar princípios e não causas. Em vez de votar processo por processo, os ministros decidirão temas que passarão a nortear todo o sistema judicial do país e o poder executivo. "Vamos tapar as brechas que permitem o recurso como artifício de adiamento", aposta Gilmar Mendes.
No caso piloto, uma questão que envolve a administração pública, a decisão do STF deve-se refletir em 580 processos semelhantes, que tramitam na própria Corte, e em mais de 2.400 casos que estão no Tribunal Superior do Trabalho. Um múltiplo desconhecido desse número envolverá os processos espalhados por todo país.
A decisão do STF de quarta-feira (30/4), tratou da possibilidade de pagamento de soldo com valor inferior a um salário mínimo para quem presta serviço militar obrigatório e a legalidade de se usar o salário mínimo como base do cálculo do adicional de insalubridade. Para o Plenário do Supremo, salário mínimo não pode servir como base de cálculo de gratificações ou adicionais.
A questão sobre a vinculação de adicional de insalubridade ao salário mínimo chegou ao STF por meio de recurso de um grupo de policiais militares paulistas. Com a decisão, o TJ paulista poderá aplicar desde já o entendimento do STF nos Recursos Extraordinários que tratam da mesma matéria.
De acordo com o desembargador Nelson Calandra, presidente da Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis), milhares de ações agora terão desfecho no TJ paulista. “É o pequeno passo de uma longa caminhada”, afirma. Segundo o presidente da Apamagis, o fato de o Supremo ainda ter editado uma Súmula Vinculante sobre o assunto mostra a vontade do tribunal em racionalizar o funcionamento da Justiça.
“A Súmula trará efeito inclusive sobre as decisões da Administração Pública, que terá de obedecer a determinação da mais alta Corte de Justiça do país. Isso irá diminuir o número de ações judiciais porque não teremos mais atos considerados ilegais ou inconstitucionais. É um verdadeiro terremoto jurídico”, diz.
O ministro Marco Aurélio definiu a sessão do Pleno do STF de quarta-feira como “aplicação da verdadeira segurança jurídica”. “O que vimos foi a palavra final do Supremo com efeito vinculante para todos os poderes. É a tábua da salvação. A esperança de que chegaremos a dias melhores. A sessão de quarta é a prova de que o tribunal vive sua melhor fase”, acredita o ministro, que já foi presidente do STF e do Tribunal Superior Eleitoral.
O ministro diz que, nesta sexta-feira (2/5), já solicitará a baixa dos processos que tratam dos temas discutidos pelo Plenário e promete liquidar todos eles “em duas ou três linhas”. “O Supremo vai viver uma época áurea de reafirmação junto a sociedade brasileira, como órgão incumbido de dar a última palavra sobre o Direito posto”, observa.
O advogado Alberto Zacharias Toron, conselheiro federal da OAB, considera que a Repercussão Geral e a Súmula Vinculante são “instrumentos mais que necessários” para a efetiva prestação jurisdicional. “O STF não pode julgar causas que interessem apenas uma ou duas partes, mas sim ações que tenham reflexo na sociedade como um todo”, afirma.
Filtro recursal
A aplicação da Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal, quase um ano depois de sua regulamentação, indica que era infundado o receio de que o instituto cercearia o acesso à Justiça. É o que se conclui da análise dos 38 primeiros casos em que a Repercussão foi analisada. Levantamento divulgado pelo Consultor Jurídico mostra que em 74% dos casos (29 recursos), os ministros entenderam que o tema merece atenção do tribunal — ou seja, o interesse da matéria transcende o interesse das partes. Somente 26% dos recursos (nove casos) receberam a negativa dos ministros.
Das matérias que mais receberam o carimbo da Repercussão Geral, destacam-se as de Direito Tributário. Elas somam 12 casos. Depois vêm as de Direito Administrativo, com nove processos. Direito Civil e Constitucional aparecem em terceiro e quarto lugares no ranking, respectivamente. Os ministros se debruçaram sobre apenas uma matéria de Direito Trabalhista e avaliaram que nela havia Repercussão Geral.
Para o presidente da OAB do Rio de Janeiro, Wadih Damous, a Repercussão Geral racionaliza o trabalho do tribunal, mas não pode ser usada apenas com este intuito. “Meu temor é que o STF despreze assuntos apenas com o fundamento de fazer com que os processos tramitem com mais celeridade”, observa. De acordo com o presidente, o ideal seria que o Supremo Tribunal Federal se transformasse em Corte Constitucional. “Essa é uma reivindicação antiga da magistratura e advocacia e acredito que seja a melhor solução para racionalizar o processo”, diz Damous. “Enquanto isso não acontece, o STF tenta se firmar como Corte e não como terceira instância, usando para isso os mecanismos previstos em lei”, finaliza. (Por Pryscila Costa).
Fonte: www.conjur.com.br
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